Porque somos naturalmente dotados dos impulsos que nos levam à frente em todos os sentidos. Somos naturalmente insatisfeitos e curiosos. Precisamos imitar mais os cães que não perdem a oportunidade de experimentar a sensação do ar fresco e do vento por puro prazer. Os cães jamais perdem a chance de sair para um simples passeio, por pura curiosidade. Precisamos resgatar o hábito de cantar no banheiro sem preocupar-se com a qualidade da voz ou com a afinação. Precisamos dançar e cantar nos dias que estamos muito felizes. A curiosidade faz sair de dentro de nós a pessoa impulsiva que cada um é. Como um saca-rolhas. Pode nos fazer tomar posse do que desejamos, ou nos faz agir sem esperar a “hora certa” como se costuma dizer. “Ai que vontade que dá!” diz bem o que nos acontece.
É uma carga de energia que, para satisfazer nossos desejos ou necessidades, nos move repentinamente.
Não. Não temos vontade de chupar um sorvete, mas sim desejo de fazê-lo. A vontade é mais abrangente, uma força que dirige todo o nosso ser e não deve ser confundida com os desejos. Normalmente manifestamos muitos desejos todos os dias. Daí surgem as dúvidas e então teremos que fazer escolhas. É quando entra a vontade em cena. Descartes diz que da “vontade dependem as ações da alma”. G. Murphy[1], um outro filósofo explica que “vontade é um complexo processo íntimo que influencia o nosso comportamento de modo a tornar-nos menos facilmente presa da pura força bruta dos impulsos.” Conversamos com nós mesmos, bolamos modos diferentes de manifestar a nossa situação e imaginamos as conseqüências das respostas. Se devo ou não, se estou certo ou errado, melhor ter ido ou foi melhor ficar, etc. Os nossos desejos exigem a ação da vontade em nosso favor. Para satisfazer os desejos vamos usar a tal força da vontade para fazer as coisas. A vontade julga os conteúdos e conhecimentos do psiquismo e da mente.
Na medida em que o nosso espírito é consultado, porque quem pensa e, de fato, tem pontos de vista, experiências, conhecimentos anteriores, medos, etc. pois é o espírito que habita o corpo e dá vida à mente, ele faz com que nossas ações sejam pensadas, ponderadas e avaliadas. Assim é o caráter do espírito que lida com o certo e o errado, conforme o grau de progresso moral que já possui. O que está em jogo nesse momento é o juízo sobre o que nos convém[2] e o que nos é lícito, bom e saudável. Não precisamos perguntar a ninguém e nem usar o exemplo dos outros se não quisermos. Fazemos isso porque, ou não estamos certos do que queremos e precisamos de aprovação, ou porque não temos conhecimento suficiente ou ainda porque temos medo de sentir culpa e arrependimento. Culpa e arrependimento geralmente estão associadas aos conceitos de castigos ou recompensas de acordo com a idéia de Deus incutida em nossa mente, por causa da educação religiosa que recebemos.
O nosso código pessoal de valores éticos, morais, espirituais já existem no espírito porque vimos de outras experiências reencarnatórias, portanto vidas já vividas. Mas estamos aprendendo e ainda não sabemos tudo. Ficamos frente a frente com os nossos princípios morais quando uma decisão é necessária. Ainda não estamos falando de virtudes, pois não somos virtuosos no sentido amplo do termo, mas o cuidado com que demonstramos intenções de agir determina a qualidade do nosso caráter. O que evidencia o nosso código moral e de valores é portanto, o que nos revela como seres éticos. A nossa maneira de ser ético, faz cair o véu do nosso verdadeiro modo de pensar, ser e agir. Com as dúvidas temos dicas que mostram o quanto ainda não sabemos, movidos que fomos pela curiosidade incessante de aprender, experienciar e desbravar.
A vontade entra na brecha entre os desejos e a dúvida, porque o espírito ainda não sabe tudo, e está em busca da virtude no seu eterno progresso. É aí que a vontade pode entrar e atuar. Não nos transformamos em espíritos virtuosos de repente. “A vontade dirige todas os setores da ação mental. Harmoniza o Espírito, disciplina e administra”[3]. Para que alguém tome posse de uma qualidade moral, será necessário repetir atitudes à exaustão no propósito de melhorar os comportamentos e atitudes. Precisamos de motivos e boas justificativas para fazê-lo. O objeto do desejo pode ser mais forte contradizendo a vontade e os princípios morais. Atitudes pensadas significam atos voluntários, conscientes, mas não espontâneos e naturais. Se o desejo e os impulsos são de má índole e fazem o torpe prazer das más realizações, é por causa da vontade que falha e cujas disposições de caráter não são boas. Quando praticamos atitudes virtuosas vamos deixando de ter que fazer escolhas, pois a nossa vontade já se tornou boa, temos assim, cada vez menos dúvidas. Atitudes edificantes ficam prontas dentro de nós. Nos debatemos menos entre o bem e o mau. Passamos a ser espíritos de boas ações e de boa fé. Tão natural como pegar uma uva no cacho.